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O CORAÇÃO

O CORAÇÃO

Para o poeta, o coração representa a paixão; para os anatomistas, um órgão muscular composto por quatro câmaras, nutrido pelas artérias coronárias; para os fisiologistas, uma bomba entre vasos comunicantes composta de um sistema elétrico próprio; para o yoga, chakra cardíaco é responsável pelos sentimentos de amor puro, gratidão e generosidade; e qual o significado para os cardiologistas pediátricos?

A cardiologia pediátrica engloba os cuidados dos pacientes portadores de cardiopatia congênita (CC) das faixas etárias mais diversas, desde o período intrauterino, infância, adolescência até o adulto. Ademais, o cardiopediatra atua no cuidado das cardiopatias adquiridas na infância (p.ex. miocardiopatias, febre reumática, Síndrome de Kawasaki, Síndrome inflamatória Multissistêmica pós Covid19, etc), e na prevenção das doenças cardiovasculares, através da identificação dos riscos, como hipercolesterolemia familiar, dislipidemias, hipertensão arterial, obesidade, etc.

O coração é o primeiro órgão a se formar e exercer função; em seu desenvolvimento embriológico, com 8 semanas já está pronto para promover a circulação sanguínea do embrião e expressar suas contrações em batimentos cardíacos, demonstrando para o mundo os primeiros sinais da vida! E quando esta chega ao fim, é ele que silencia, sinalizando a partida…

O sistema cardiovascular tem sido extensamente estudado por diversas especialidades, considerando que suas afecções representam a maior causa de morte no mundo, como a doença arterial coronariana e algumas formas de insuficiência cardíaca, que em muitas das vezes podem ser evitadas. As cardiopatias podem ser determinadas por fatores genéticos, ser adquiridas ou congênitas.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), aproximadamente 300 mil crianças morrem, no mundo todo, dentro das primeiras quatro semanas de vida em decorrência da presença de anomalias congênitas, sendo os defeitos cardíacos o tipo mais comum de malformação existente ao nascimento e correspondendo a 30% dos óbitos neonatais.

As cardiopatias congênitas (CC) são as malformações ou “defeitos” que ocorrem no período embrionário, afetando a anatomia e/ou a função do coração e seus vasos e estima-se que estão presentes em cerca de 1 a cada 100 nascidos, chegando a 1,35 milhões de nascidos/ano no mundo e 29 mil NV/ano no Brasil; 6% deles morrem no primeiro ano de vida e 1 em 4 bebês com CC necessitará de procedimentos (cateterismo ou cirurgia) antes de completar 1 ano de vida. As CC figuram entre as principais causas de morte na primeira infância, representando um importante problema global de saúde.

Na maioria dos casos, não é possível identificar fator causal das CC, no entanto, é sabido que exposição intraútero a determinadas substâncias químicas (ex. medicamentos, solventes, álcool e entorpecentes), radiação, infecções virais maternas e picos glicêmicos no período da embriogênese podem ter efeitos deletérios sobre o sistema cardiovascular do embrião, além de outros fatores de risco, como a história familiar positiva e síndromes genéticas associadas. No 3º trimestre, sugere-se evitar alimentos ricos em polifenóis e flavonóides, pois podem interferir na dinâmica do fluxo do canal arterial. 

O diagnóstico pré-natal das malformações cardíacas do feto, através do ecocardiograma fetal, tem demonstrado ser de grande valia de modo que permite um melhor planejamento do parto e atendimento adequado no tempo correto, incluindo a possibilidade de intervenções cardíacas intraútero (p.ex. valvoplastia aórtica). Recomenda-se que o exame seja realizado entre 22 a 28 semanas de gestação em todas as gestantes, independente do resultado do ultrassom morfológico (podendo ser antecipado nos casos de US morfológico alterado).

Após o nascimento, as cardiopatias podem se manifestar clinicamente nas primeiras horas de vida, no teste do coraçãozinho alterado, durante a infância ou adolescência e em alguns casos, na vida adulta ou até mesmo no idoso (p.e. comunicação interatrial, coarctação da aorta, etc.), com necessidade de intervenções como cateterismo cardíaco (oclusão de defeitos septais/shunts, valvoplastias, angioplastias, implantes de valvas, etc.) ou cirurgia (paliativas ou corretivas). Continuamente, novas técnicas terapêuticas vêm sendo desenvolvidas oferecendo maior sobrevida e qualidade de vida para estes pacientes.

Em se tratando do significado etimológico das palavras, cardiologia (grego: kardia) e pediátrica (grego: paidos e iatreia) podem significar “processo de cura do coração da criança” que, para os cardiopediatras, pode ocorrer a qualquer tempo da vida. Nossa missão é auxiliar nossos pacientes a alcançarem sua potencialidade através do cuidado com o coração.

“Que o nosso coração seja puro como de uma criança…”

Giolana Mascarenhas da Cunha

Graduação em Medicina 2011 – Universidade Federal de Pelotas – RS

ResidÊncia em Pediatria – Grupo Hospitalar Conceição – Porto Alegre – RS

ResidÊncia em Cardiologia Pediátrica – Hospital Infantil Pequeno Príncipe – Curitiba – PR

Fellow em Cardiologia Intervencionista em Cardiopatias Congênitas – Instituto do Coração (InCor) da Universidade de Sào Paulo (USP-SP).

CRM-PR 32784.

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