Doença dos olhos que afeta jovens adultos
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Com pouco mais de 20 anos de idade, João Batista sentiu os efeitos dos primeiros sintomas. A visão parecia estar falha, vez ou outra sentia uma dificuldade maior para enxergar, irritabilidade nos olhos. Na primeira consulta oftalmológica, ainda nos anos 80, o diagnóstico foi: vistas cansadas que exigiam óculos de descanso.
Os anos foram passando e os sintomas só pioraram. Com quase 40 anos e a visão um tanto quanto prejudicada e após uma dezena de tentativas frustradas, o diagnóstico chega de uma forma surpreendente e sem precedentes. João estava com uma doença ainda pouco conhecida, até mesmo para a Medicina moderna e com um nome bem difícil de ser memorizado: Fundus flavimaculatus ou a doença de Stargardt.
Em resumo, uma degeneração da mácula com perda de visão progressiva, com mais ou menos gravidade, variando de paciente para paciente caso alguns cuidados básicos não forem adotados, como: estar sempre com os olhos protegidos com óculos escuros de boa qualidade ao sair ao sol, manter a hidratação dos olhos e se esbaldar com alimentos ricos em antioxidantes.
Isso porque a doença ainda pouco conhecida e estudada, não possui um tratamento ou um remédio que possa curá-la. Sim, ela não tem cura.
O diagnóstico caiu como uma bomba. Mas como isso seria possível em uma família aonde as demais pessoas não tinham problema de visão, ao menos não neste nível de agressividade?
A resposta veio da ciência. Essa falha genética veio do pai ou da mãe, mesmo que eles não tivessem desenvolvido a patologia. Cada filho exercia uma probabilidade média para manifestá-la.
Pouco tempo depois, João descobriu não estar só no diagnóstico familiar. Ele foi o quarto filho e, portanto, talvez se justificasse os 100% de probabilidade de desenvolver a falha no gene. Sua irmã mais nova, a oitava filha, também tem a doença. “É como se existisse areia nos olhos, parece que vários pontinhos pretos atrapalham a visão e nós dois tínhamos aquilo, nela em um estágio menos avançado. Já tentamos tudo o que poderia ser viável, mas por enquanto, sigo com a doença e com a esperança que um dia ela possa ser decifrada e por fim, encontrarem sua cura. Sonho com este dia”, reforça.
Sem relatos de cegueira
Foto: Cesar Pillati
A boa notícia para João e para as pessoas que desenvolveram Fundus flavimaculatus, é que não há registros de cegueira em decorrência desta anomalia. A avaliação é feita pelo oftalmo, André Luís Himauari. Himauari, hoje lotado em Cascavel, graduado em Medicina pela Unig/RJ (Universidade Iguaçu) com residência em Oftalmologia no Hospital de Base do Distrito Federal, especialista titulado pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia e fellow na área de córnea e doenças externas do Serviço de Oftalmologia do mesmo Hospital de Base. “Esta é uma doença do metabolismo com a pigmentação da retina, uma desordem genética como se fossem alterações degenerativas. Um envelhecimento com uma atrofia muscular”, explicou.
O especialista considera que ainda não há cura, mas acredita que as pesquisas em nanotecnologia e com células-tronco possam minimizar muito os efeitos. “Hoje ela é facilmente detectada porque se mostra com uma baixa visão em adultos jovens, são lesões amareladas no fundo do olho, uma atrofia macular”, explica ao lembrar que ela é melhor acompanhada por profissionais retinólogos.
Ainda de acordo com o oftalmo, não há formulas mágicas para frear a doença, mas existem vitaminas, alimentação saudável e um estilo de vida equilibrado que podem evitar a piora progressiva. “Mas ela progride até um certo ponto e tende a se estabilizar. Em algumas pessoas acaba evoluindo para a perda de visão, chegando até 5% a 20% da capacidade visual. Mas em um número de pessoas ela estabiliza confirmando uma acuidade maior e uma vida praticamente normal”, destacou.
Um pouco mais sobre a doença
A doença de Stargardt é a forma mais comum de degeneração macular juvenil. Nela ocorre a perda progressiva das células fotorreceptoras da mácula, gerando a redução da visão central, com a preservação da visão periférica. Porém, a visão periférica também pode ser afetada em estágios mais avançados da doença e em casos mais raros. A doença aparece, normalmente, entre os 7 e 20 anos. A progressão varia de pessoa a pessoa, podendo se agravar após os 50 anos.
Quase sempre é herdada sob a forma autossômica recessiva. Ambos os pais, chamados portadores do gene, transmitem a doença, ainda que eles próprios não sejam afetados, porque têm apenas uma cópia do gene (são necessários dois genes alterados para que a doença apareça). O risco de uma criança ter Stargardt quando os pais são portadores do gene é de 25% em cada gestação. Nesse caso a criança herda uma cópia do gene da Stargardt de cada um dos pais. Alguns dos genes causadores da doença já foram localizados.
Pesquisas recentes comprovam que o Stargardt pode, em casos mais raros, ocorrer pela mutação dos genes dominantes ELOVL4 e PROM1. Por serem genes dominantes, a presença de somente um gene afetado é suficiente para manifestar a doença.
Suas mutações estão sendo estudadas, a fim de que se possa entender melhor os mecanismos que causam a doença e se desenvolver um tratamento. Há pesquisas em curso, em vários países, que estudam diferentes formas de tratamento para a doença como medicamentos, terapia gênica, cirurgia de implante com células-tronco e até mesmo implante de chip, conhecido como Olho Biônico.
Estima-se que na população brasileira uma a cada 10 mil pessoas tenham Stargardt.
Sua relação com as distrofias retinianas
Ela é responsável por aproximadamente 7% das distrofias retinianas. Recentemente, uma pesquisa com animais comprovou que o uso de lentes escuras, sempre que houver luz solar, é importante para impedir a progressão da doença.
A doença Fundus flavimaculatus é geralmente de padrão autossômico recessivo, caracterizada ao exame pela presença de flecks amarelados no nível do epitélio pigmentado da retina. Estes podem aparecer na periferia da retina e permanecer confinados a ela, porém mais frequentemente localizam-se na área macular. O prognóstico varia bastante entre os pacientes. Na maioria dos casos, especialmente no início, o exame eletrorretinográfico é normal.