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Homenagem aos médicos que nos deixaram

O ano de 2019 foi marcado também pelo passamento de muitos médicos. A Associação médica de Cascavel presta uma homenagem a todos, bem como expressa os mais profundos sentimentos aos familiares e amigos. O renomado médico cascavelense Dr. Jesus Lopes Viegas presta uma homenagem a três deles, homenagem essa que se estende a todos os que partiram. Nossa gratidão a todos.

Foto: Cesar Pilatti

Retrato de Dr. Jesus Lopes Viegas para homenagem prestada aos colegas falecidos
Dr. Jesus Lopes Viegas para o quadro “Retratos vivos”

German Jimenez, o Médico de fala esquisita

Em janeiro de 1977 nasceu esta amizade sem fim, assim digo, pois, mesmo estando em mundos diferentes sempre seremos amigos. Partiu sem despedidas, sem o “Até Más” que era o seu até logo.

Relembrando o que seu filho de mesmo nome relatou:

− Muitas pacientes diziam, ele tem uma fala esquisita, pois não perdera o sotaque equatoriano.

Não fazia distinção, atendia quem quer que fosse para depois ver formas de pagamento. Era alegre, carinhoso e gostava de ver o belo, foi transformando rostos e corpos que se notabilizou como cirurgião plástico.

Eu carioca cheguei para começar nova vida nesta cidade, meu amigo Jimenez me disse:

− Jesus, venha trabalhar comigo.

Estava começando, trabalhamos dividindo salas em horários diferentes na Galeria Paschoal. A convivência se manteve, participamos juntos no Lions Club Cascavel Centro, o sucedi na presidência.

Trabalhou no SESI, neste período a Sonia, minha esposa, era a diretora. Na mesma época estavam juntos o Júlio (Pneumo), Manoel (dentista) e o Osmar (Psiquiatra), Odilo Khun e o Dauri sempre aprontavam brincadeiras que acabavam em boas gargalhadas.

Foto: Cesar Pilatti

German Jimenez, o Médico de fala esquisita
Dr. German Jimenez no exercício de sua profissão

Em muitas festas estivemos um na casa do outro. Lembro-me que uma noite acabou ficando sozinho no escritório da casa da Mato Grosso, 2250, esquina  com a Rua Afonso Pena escutando as “Rosas não falam de Cartola” até que terminou a garrafa de whisky. A esposa Hebe, a Sonia e a Maria do Rocio o deixaram foram dormir, e ele ficou sozinho curtindo saudades.

Viajamos para Marília-SP para o casamento do Rafael com a Paulinha e até um carro foi furtado, mas nada o tirava do sério. A alegria era sua maneira de ser.

Em um jantar no Edifício Gênova, um grupo grande da FACIAP estava aguardando um prato especial. A Sonia e a Maria do Rocio se viravam na cozinha, o Jimenez viu que elas improvisavam usando Shoyu em vez de outro tempero que estava em falta no momento.

Esperou o momento e quando todos estavam se servindo e já degustando, ele fez um gracejo:

− Só está faltando Shoyu para melhorar o sabor.

− Cruzes, Shoyu nem vai neste prato — vários gritaram!

− “É ele não sabe o que está dizendo”. Reforçaram a Sonia e a Maria do Rocio. Ele confirmou:

− “É mas com Shoyu ficaria até melhor. As duas calaram-se e entreolharem-se. Assim era o Jimenez, sempre alegre e brincalhão.

Sêneca em sobre a brevidade da vida. (Penguin e Cia. das Letras) “Não dispomos de pouco tempo, mas desperdiçamos muito. A vida é longa o bastante e nos foi generosamente concedida para a execução de ações, as mais importantes, caso ela seja bem aplicada”.

Nós sempre achamos que o tempo foi curto, quanta coisa gostaríamos de conversar, discutir, pedir opinião, mas não deu tempo, deixamos para depois,e o depois foi ontem!

Uma história que rendeu até reportagem da Veja, foi com o Dr. João que era prático de farmácia ou “aprendiz de médico”, para não o taxar de falso médico. Tinha uma lábia e conquistou muitos clientes, quando trabalhava sozinho, na maioria das vezes acertava o diagnóstico e o tratamento, assim ia constituindo uma grande legião de fãs, clientes e até que convidou o Dr. Jimenez para assumir a Clínica. O meu amigo ingenuamente assim o fez. Quando a reportagem chegou foi logo dizendo:

− Não aqui eu trabalho na administração, o médico é o Dr. Jimenez.

E este não sabia do passado tenebroso do ex-futuro colega que resolveu viajar e tirar umas férias, mas diante de tantos problemas o Jimenez abandonou a Clínica e retomou o seu trabalho original. O Dr. “João” sumiu na poeira do sertão.

No passado recente, virou avô compulsório e todas as vezes que o convidava para um vinho em minha casa, alegava: “primeiro tenho que ver com quem vão ficar os netos” e muitas vezes confirmava o título de Avô querido.

Até Más, meu amigo!

Doutora Guiomar e o modelo da vitrine

Desde 1977 tenho boas lembranças do casal que até então trabalhava na Policlinica: o Dr.  Richard e a Dra. Guiomar, ela com uma voz um pouco rouca ou de contralto embora só a tenha visto cantarolar poucas vezes, pois gostava era de tocar violino.

Seus filhos ainda estavam estudando fora e eles juntos com Mirandinha Drumond e Álvaro tocavam o serviço no hospital. Tinha preferência pela ginecologia, e lembro-me que ao ser aposentada foi me procurar no IPMC, para que se possível não liberasse sua aposentadoria, pois não queria parar de trabalhar. Como a Legislação não me permitia, se propôs a trabalhar de graça, como voluntária, mas o “jurídico” da prefeitura não o permitiu. Para os jovens e seus filhos era um exemplo de dedicação, mas uma Legislação retrógada deixou-a frustrada; ficaria mais tempo com a sua filha que muito dependia de seu carinho.

A Loja Gaúcha tinha uma vitrine grande que começava na frente da rua e ia até o interior da loja e eu estava dentro da vitrine para indicar a um vendedor um tipo de camisa que eu gostei. Ao avistar-me pelo vidro entrou na loja e foi logo perguntando quem é o modelo, o manequim vivo que está se exibindo para a clientela. O vendedor ficou assustado, mas ao ver o meu sorriso entendeu que éramos conhecidos e que aquilo era seu modo de ser. Num festival de música de Cascavel fui influenciado por ela para tocar violino, e eis que me vi no palco do teatro tocando violino pelo método Suzuki no meio de um grupo de crianças. Foi muito divertido e a Dra. Guiomar estava na plateia me aplaudindo, amizade faz essas coisas.

Sempre nos falávamos em seu aniversário, mas naquele ano ela estava internada por uma complicação pulmonar e eu fui até o seu quarto na Policlínica, o mesmo hospital que ela tanto amou, se dedicou e agora estava como paciente.

Fui cumprimentá-la pessoalmente e levei um presente, lembro-me que foi um lenço de pescoço bem a seu estilo. De elegância, era cor roxo claro, ficou emocionada, mas assim sempre foi nossa amizade. Nos dois últimos anos não foi possível vê-la ou falar-lhe, mas com certeza soube de minhas preces para seu conforto, seu bem-estar, até o momento que mudou de plano, deixando saudades aos amigos.

João Medeiros Braga: Médico, poeta e declamador

Dr. Braguinha: dizer ao certo quando o conheci, não saberei, mas já se vão muitos anos, sempre nos momentos alegres nos encontrávamos e com seu sorriso franco e forte e seu abraço afetuoso marcava sua presença.

Nos bailes da UNIMED e da AMC lá estava ele brilhando no meio do salão exibindo sua dama e par constante, a “Tere” que bailava embevecida em seus braços, como sendo sua musa inspiradora.

Gravou um CD com poesias próprias que não divulgava muito, mas sempre falando de amor e ressaltando a paixão à sua amada.

“Suas habilidades de cirurgião em otorrinolaringologia, palavra que é difícil até para compor uma rima”, eram ressaltadas por todos, mas como declamador sempre elogiava nossa colega, a Helena Lucia com o poema que enaltecia a mulher.

Carioca da gema, todas as vezes que podia, ia ao Rio matar saudades.

Certa vez um fato interessante marcou suas férias na cidade maravilhosa. No mesmo período e espaço, estava eu com minha família passeando pelo Shopping Mall na Barra da Tijuca, quando nos encontramos em um restaurante. Ao ver primeiro minha mulher, foi ao seu encontro e em alto e bom som a saudou e a abraçou perguntando onde está o Jesus. Quando ouvi meu nome me virei e também fui saudá-lo com um grande abraço. Naquela época usava sempre um óculos pendurado no pescoço igual ao que ele também usava e qual foi minha surpresa que ao retornar a minha mesa, senti falta dos óculos e voltei para encontrá-los. Quando ao retornar a mesa do Braga, eis que vejo um caso inusitado: pendurado em seu pescoço estavam os dois óculos. Foi uma gargalhada geral e todos se levantaram e procuravam entender o que estava acontecendo, tudo por conta dos abraços entrelaçados.

No último encontro que tivemos que foi na festa de 50 anos da Associação Médica de Cascavel devido a problemas de coluna, estava com dificuldades para andar, e valia-se de uma cadeira de rodas, mas mesmo assim circulou pelo salão, risonho e recebeu a medalha de 50 anos e pôster do “Retratos vivos” que serviu de modelo para a revista.

Já tinha sido condecorado com a medalha de mérito pelos seus cinquenta anos de trabalho ininterrupto em prol da medicina. A seu pedido deixei para depois tomarmos um café com bobagens (como diz o mineiro), mas esse depois não chegou. Ele não encontrou a data e ficou para depois, assim como não o terei no lançamento de meu próximo livro,

Homenagem estendida também a:

Dr. Rodrigo Guimarães Mesquita

Dr. Luiz Enio Sella

Dra. Joseney de Fátima de Oliveira Cegantini

Dr. Antônio João

Dr. Eduardo Phillip

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